Conto

A voz da madrugada

   Já eram mais de 3 horas da madrugada, estava bastante frio, o inverno aquele ano era rigoroso. Roger voltava da balada sozinho, não era muito longe sua casa e como estava frio, achou bom ir a pé, ao invés de pegar um táxi.
   Passava por uma rua muito silenciosa quando ouviu uma voz lhe chamando. Olhou pra trás, não havia ninguém, do outro lado da rua também não via ninguém, apesar de que naquele trecho uma lâmpada de um poste estava estragada e estava bem escuro. Achou melhor continuar andando, provavelmente era só uma impressão sua.
   Roger andava rápido e atento, tinha medo de assaltantes, o bairro era perigoso.
   Quando já havia esquecido da suposta voz, eis que ouve novamente alguém lhe chamando, agora era mais nítido, ouvira claramente, alguém o chamava. Teve medo, era estranha aquela voz naquela hora da noite. Não havia nenhum amigo seu que morava por aqueles lados, nem mesmo um conhecido que pudesse interpelá-lo naquele momento. Olhou assustado por todos os lados, não havia ninguém.
   __Que diabos é isso__falou consigo.
  Apressou ainda mais o passo, queria chegar logo em casa, já estava perto. A noite lhe parecia agora assustadora. Havia algo naquela voz que lhe deixara atônito. “Não foi impressão minha, tenho certeza, era alguém me chamando, ouvi claramente”, pensava.
   Quando dobrava uma esquina, Roger ouviu bem alto e em bom som aquela voz sinistra novamente. Arrepiou-se. A voz não parecia humana, era algo terrivelmente assustador. Por um momento, o rapaz parecia paralisado de terror, mas imediatamente colocou-se em disparada, aterrorizado.
   __Meu Deus, meu Deus, o que é isso?__falava baixinho com a voz tremida e entrecortada, quase sem fôlego por causa do susto e da velocidade em que corria. É difícil descrever o medo que sentia o pobre rapaz, nunca na vida sentira tanto medo. Aquela voz ecoava em seus ouvidos, perseguia-o. O medo era tanto, que Roger corria como cego. Sorte que àquelas horas não havia movimento algum naquelas ruas, pois desorientado como estava, certamente seria atropelado.
   Mas a voz não se repetira, ninguém o perseguia. Depois de muito correr, chegara em casa. Suava frio, não por causa da temperatura amena, mas por causa do medo. Estava arrepiado de terror. Entrar em casa pareceu aliviar aquela sensação de pânico, no entanto, ainda estava muito perturbado. A voz não saia de sua mente, aquela voz era diabólica, horrenda.
   Roger tentava se acalmar, mas a sensação de que a voz novamente pudesse retornar lhe apavorava. Não conseguiria dormir, era impossível. Se ao menos tivesse alguém em casa pra lhe fazer companhia, iria se sentir mais seguro.
   Roger não podia ficar ali sozinho, ainda estava em pânico. Porém, a ideia de sair de novo à rua era ainda mais aterrorizante. O que fazer? Pensava. Teve então a ideia de ligar para um amigo, talvez falar do ocorrido lhe acalmasse, ou melhor, esse amigo poderia vir até sua casa e lhe fazer companhia. Lembrou-se imediatamente do grande amigo Fábio, apanhou o celular do bolso, suas mãos tremiam, ligou. Depois de muito chamar, caiu na caixa postal.
   __Droga!__xingou.
   Pensou então em uma amiga, Joyce. A garota atendeu logo, por sorte tinha acordado nesse momento pra ir ao banheiro, ia deitar novamente quando seu celular tocou. Estranhou aquela ligação, atendeu curiosa:
   __Alô, Roger?
   __Joyce, me ajuda, por favor, estou desesperado!
   A amiga notara a voz ofegante, ficou preocupada:
   __Calma, cara, o que tá acontecendo?
  __Uma coisa terrível, Joyce, terrível, uma voz muito esquisita me chamou na rua, tenho certeza, era algo assustador, você me conhece, eu não iria te incomodar a essas horas, por favor, me ajude!!
   __Roger, como assim uma voz esquisita, não era alguém te chamando realmente, sei lá, um amigo ou conhecido?
   __Não! Não era! Essa voz me chamou três vezes, nas duas primeiras não dei muito crédito, pensei que fosse algo da minha cabeça, mas na terceira vez__engoliu em seco__ foi muito nítido, parecia um monstro, aquela voz não era de uma pessoa, não poderia ser!
   Joyce empalideceu, confiava no amigo, sabia que ele estava falando a verdade. Roger era um rapaz muito sério, não ia fazer pilhéria com ela àquelas horas da madrugada. Além do mais, Roger não poderia ser tão bom ator assim, porque a sua voz não negava que estava realmente assustado.
   __Fique calmo, Roger, vou chamar meu irmão e iremos até sua casa. Procure rezar, não entre em desespero.
   __Obrigado, não demore, por favor.
   __Estarei aí o mais rápido possível.
   Ao desligar o telefone, o rapaz já parecia mais calmo, o simples fato de conversar com alguém já o deixava mais tranquilo.
   A sua boca estava seca, foi até a cozinha beber água. Quando estava a tomar o líquido, eis que novamente a tão temida voz rasga o silêncio:
   __Roger! Roger!
O copo se espatifou no chão, o rapaz soltou um grito que veio a acordar a vizinhança. Roger não via nada, mas sentia que algo lhe tocava, algo profundamente gelado e maquiavélico. O rapaz perdeu os sentidos, sua vista escureceu e ele caiu no meio dos cacos de vidro espalhados pelo chão.
   Dali dez minutos, Joyce e o irmão chegaram. Roberto ralhava com a irmã que lhe acordara aquela hora para, segundo ele, acudir um marmanjão medroso.
   __Que estranho, tá chamando, mas ele não atende o telefone. Vamos tocar a campainha.
   Joyce tocou uma, duas, três vezes, nada. O irmão xingava:
   __Esse patife lhe passou um trote e já tá dormindo. Amanhã vai ligar pra zombar da sua cara
   __Não acredito que ele faria isso.
  __Você é muito boba, Joyce, acredita em tudo que as pessoas falam. Não sei por que que eu fui ouvir você, essa história só poderia ser brincadeira.
   Nesse momento, alguns vizinhos que haviam acordado com o grito de Roger, abriram a janela de seus apartamentos e viram o casal de irmãos discutindo.
   __O que tá acontecendo?__perguntou um dos vizinhos, um senhor que parecia um pouco irritado.
   __Me desculpe__respondeu Joyce__é que um amigo meu que mora no apartamento 6 me ligou pedindo que eu viesse até aqui, precisava de ajuda, mas agora ela não tá atendo o telefone e nem a campainha.
  __Acordei agora, e me parece que foi por causa de um grito ou coisa assim vindo de um dos apartamentos. Qual era o problema do rapaz?
   __Ele disse que estava ouvindo uma voz estranha lhe chamar, eu sei que parece coisa de louco, mas meu amigo é muito sério, não acredito que estivesse me pregando uma peça, ele nunca foi disso.
  O velho aborreceu-se ainda mais, provavelmente o rapaz usava drogas, teve uma dessas malditas alucinações, borrou nas calças e resolveu ligar pra amiguinha boazinha, que sempre se preocupa com os outros.
   Mas pensando que realmente o que lhe havia acordado era um grito, o vizinho achou que o rapaz estivesse mesmo em apuros, talvez sofrido um colapso nervoso por causa daquela merda de droga. Aconselhou:
   __Se ele realmente ligou pra você e agora não dá sinal de vida, é melhor chamar a polícia.
   __É o que vamos fazer. Obrigado, senhor, desculpe incomodar.
O velho foi se recolher novamente, xingava, essa cambada...
   __Não acredito que vamos chamar a polícia por causa disso, você acha que eles vão acreditar nessa história sem pé nem cabeça___Roberto aborrecia a irmã.
   __Não ouviu o que o velho disse, ele parece que acordou com um grito...Vou ligar mais uma vez pra ele antes, toque a campainha de novo.
   Roberto tocou, muito a contragosto, mas tocou, umas cinco vezes. Joyce ligou mais umas três vezes, nada, chamava, chamava e ninguém atendia.
   Mais preocupada ainda por causa do grito que o vizinho dissera ter ouvido, Joyce não hesitou em chamar a polícia. No instante em que ela discava o 190, uma viatura passava pela rua fazendo ronda, a garota acenou com a mão.
   __Posso ajudar, senhorita?
Ela explicou tudo. Os policiais fizeram cara feia, mas compreenderam que Joyce, ainda que fosse ingênua, não estava sendo tola. Havia algo estranho.
   __Vamos ter que arrombar o apartamento___disse um dos policiais.
   Encontraram Roger caído em meio aos estilhaços de vidro, havia se cortado e o sangue escorria pelo chão da cozinha. Os ferimentos não eram graves, o sangue não era muito, nada que pudesse levar alguém à morte. No entanto, ao examinar o rapaz, os policiais constataram o trágico fim, Roger estava morto.

Maciel Santos 

Um comentário:

  1. Bom, o conto tem duas particularidades a meu ver. Vou falar da forma como vc narrou e do conteúdo, a mensagem que vc quis passar. Sinto que no aspecto narrativo você poderia ter inovado mais, eu sei que isso é difícil, mas sei lá, senti falta de algo diferente que valorizasse a narrativa entende? vc escreveu de maneira um pouco previsível, a fala das personagens muito certinhas. Isso tudo no aspecto da forma de escrever. Quanto à mensagem, bem, histórias apavorantes sempre fazem sucesso e o legal é que realmente vc consegue prender o leitor, fiquei ansioso no decorrer da história e diria que este é o ponto mais interessante de sua composição. Você fez uma excelente jogada, pois o clímax da história é justamente o anticlímax. Ou seja, o leitor ansioso pra saber que o personagem não morreu, que lhe aconteceu outra coisa, justamente se depara com a morte do mesmo, algo que subconscientemente era provável, mas não cogitado para encerrar a história. Diria que foi esse seu grande golpe de mestre mano! Outra coisa bastante interessante é que esse tema realmente mexe com nossas cabeças. Afinal o medo é algo existente em nossas vidas. E o mal também! Deus me livre! O que te inspirou? "Fear of the dark"rsrsrsrs? Pois é dizem que na quaresma o diabo anda solto!! Arreda, cruzes!
    Fim da conversa no bate-papo

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